ESPAÇO COLECTIVO ARTISTICO E CULTURAL - COORDENADO PELA POETISA AMÉRICA MIRANDA - E ONDE SE INSEREM AS CONTRIBUIÇÕES DE TODOS OS TERTULIANOS, TANTO EM VERSO COMO EM PROSA, COM O OBJECTIVO DE DIVULGAÇÃO E HOMENAGEM AO GRANDE POETA ELMANO SADINO !
Quarta-feira, 8 de Fevereiro de 2006
CRÍTICA BOCAGEANA - FALAM OS ESPECIALISTAS !
TEÓFILO BRAGA
Quando um Burger, um Uhland, um Wiland, se iam inspirar nas fontes tradicionais da sua nacionalidade, e criavam na sua independência e originalidade a literatura alemã, a falta desta intuição amesquinhou o maior génio poético que o século XVIII produziu em Portugal; começou Bocage por imitar a Arcádia, os quinhentistas, o pseudoclassicismo francês, e acabou por traduzir o latim (
). A este império da imitação deveu Bocage os defeitos de quase todas as suas composições, uma constante alegorização dos sentimentos personificados em entidades, a mitologia morta falsificando sempre a expressão das emoções, além do invencível cunho do convencionalismo dos tropos retóricos.
Esta precocidade ( poética ), que alardeia, mostra-nos que o raro dom começou a fazer que o cercassem de admirações muito cedo, despertando-lhes antes do tempo um exagerado sentimento da personalidade; os gabos enfatuaram-no, colocaram-no na dependência de quem o lisonjeasse, e tornaram-no de uma sensibilidade extrema diante da crítica. A improvisação, de que tanto abusou, que foi a base das admirações, e as sátiras virulentas, que vibravam implacavelmente, provinham da necessidade de aplauso, mesmo banal, e dos ressentimentos de uma vaidade ferida.
Bocage era atraído pelas cantigas estonteantes que se entoavam num ou noutro café, e que a diligência do Manique conseguia logo abafar. A impressão dos principais sucessos da Revolução Francesa existe fixada nos versos de Bocage; vibraram na sua bela alma, que tinha o poder, como o confessou Lord Beckford, de governar a seu capricho as impressões dos outros. A poesia era a expressão do seu estado de espírito revoltado; feria inconscientemente com as sátiras pessoais e dava largas à liberdade de pensamento desse negativismo crítico do século XVIII.
apesar de gastar todo o estro nas banalidades dos motes insípidos dos outeiros das eleições de abadessados e das luminárias reais, de longe em longe o seu instinto da liberdade suscitava-lhe algum soneto, que vinha preparar-lhe a ruína.
Teófilo Braga,
In "História da Literatura Portuguesa"