ESPAÇO COLECTIVO ARTISTICO E CULTURAL - COORDENADO PELA POETISA AMÉRICA MIRANDA - E ONDE SE INSEREM AS CONTRIBUIÇÕES DE TODOS OS TERTULIANOS, TANTO EM VERSO COMO EM PROSA, COM O OBJECTIVO DE DIVULGAÇÃO E HOMENAGEM AO GRANDE POETA ELMANO SADINO !
Quinta-feira, 17 de Fevereiro de 2005
EDITORIAL BOCAGEANO - "EM LOUVOR DE BOCAGE"
Por
América Miranda
Pode afirmar-se que Bocage, o grande Vate, tem três facetas - a lírica, a
satírica e a erótica. Em todas elas o seu génio ficou bem marcado, sobretudo
na lírica.
Dessas três facetas se projecta desde logo o que poderá ser considerado como
fundamental em Bocage - Homem ou Poeta - o seu carácter eminentemente
contraditório. Aliás esse carácter pode, com certa propriedade,
justificar-se no tempo em que viveu e do qual, entre nós, Bocage é o mais
fiel paradigma. Será pois, embora simplisticamente possível, crer-se que
Bocage educado por forma tradicional, mas por outro lado culturalmente
interessado no que se passava no resto do mundo, sofresse na carne a
contradição da época. Ser contraditório por excelência acentua-se na sua
poesia - a uma vida desregrada e louca, contrapôs uma obra de
extraordinário rigor formal, onde à beleza clássica se juntavam já os
clarões renovadores do Romantismo.
Bocage em todos os aspectos da sua poesia, desviava para a mesma, todas as
regras, todas as exigências, toda a disciplina que, na sua vidas quotidiana,
tantas vezes desprezava.
América Miranda
In O ARAUTO DE BOCAGE, Nº s. 83 / 84
A TRIBUNA DOS POETAS - EUGÉNIA CHAVEIRO
Por
Eugénia Chaveiro
É PRECISO DAR BRADO
Oh tempo passado
Longa caminhada
Em que a flor era acarinhada
Hoje, mal se apanha regada
Tanto tempo perdido
Bem julgando, mal vivido
Onde em vez de um riso
Se solta um gemido
Não sabem donde ele vem
Desse órgão esquecido
Que se chama coração
Soltando um pregão
Que não é ouvido
Gritando aos quatro ventos
Aos cinco sentidos
Mudaram-se os tempos
Mas aos sentimentos
É urgente dar Brado !...
Eugénia chaveiro
Quarta-feira, 16 de Fevereiro de 2005
POETAS CONSAGRADOS - ANTERO DE QUENTAL
SONHAR A VIDA INTEIRA
Num sonho todo feito de incerteza,
de noturna e indizível ansiedade,
é que eu vi teu olhar de piedade,
e, mais que piedade, de tristeza.
Não era o vulgar brilho da beleza,
nem o ardor banal da mocidade;
era outro brilho, era outra suavidade,
que até nem sei se as há na natureza.
Um místico sofrer; uma ventura,
feita só do perdão, só da ternura
e da paz da nossa hora derradeira.
Oh! Visão, visão triste e piedosa,
fita-me assim calada, assim chorosa,
e deixa-me sonhar a vida inteira.
Antero de Quental
In PRIMAVERAS ROMÂNTICAS
PALAVRAS DOS NOTÁVEIS SOBRE BARBOSA DU BOCAGE
Pinheiro Chagas - « O ardor do pensamento comunicava-se-lhe ao verso que ninguém fez mais sonoro, à frase que ninguém teve mais pura, mais portuguesa e nobre. ( ... ) Essas traduções são verdadeiras jóias; lapidadas, faceadas por este maravilhoso artista, pedras nem sempre de grande preço resplandeceram em português como diamantes da mais pura água. ( ... )
O estro de Bocage não era só luz, era chama; a sua vida foi um incêndio. Resplandeceu, deslumbrou, deu relevo a tudo com seu clarão purpúreo. ( ... )
A sua voz, como a dos profetas, vibrava tanto mais inspirada quanto mais longe lhe ficava a terra; o seu estro, como a águia, só mostrava bem a amplidão das suas asas em presença das imensidades. ( ... ).
Vesúvio d' inspiração, vendaval de lirismo...
... Alma de poeta, como nunca houve outra em Portugal. ( ... )
Saíste do mundo, no vigor da mocidade, quando se rasgava ao teu génio novos horizontes...»
Bulhão Pato - « Se houvesse nascido no princípio deste Século, Bocage seria um poeta extraordinário. Não teve horizonte para bater as asas, de larga e poderosa envergadura. Ainda assim, nos seus versos há sempre, ou o fuzilar do relâmpago ou a gorgeada cadência de fonte nativa e cristalina ».
Gomes Leal - « Vejam esta cantata à morte da linda Inês... Leram ? É aligeireza de Anacreonte com a melodia de Ovídio ».
Teófilo Braga - « Camões não teria sido mais do que Bocage, comprimido em uma sociedade apática, sequestrada ao conv´vio europeu pelo regime policial ».
Mayer Garçon - « Uma grandiosa ideia germinou no seu cérebro, e se expandiu no seu coração, e cantou nos seus lábios: a ideia de que o mundo não podia, não devia ser uma masmorra lôbrega e sombria donde os olhos de voluntários encarcerados se não alongassem à natureza que desprezaram. »
Afonso Gaio - « Havia de labutar-se pela sua reabilitação, conferindo-lhe o prestígio que merece, porque a Bocage só o leêm as pessoas cultas, que se dão à tarefa de setudar a época em que viveu, como na presente, ainda o não compreendem ».
Ana de Castro Osório - « Como nenhum outro português, Bocage, erm suas desditas, comove a alma popular, que o comprrende porque por ele se sente representada».
Manuel de Arriaga - « ( ... ) maior metrificador da língua portuguesa ».
Mariana Angélica d' Andrade - « Foi a Poesia o seu constante anelo ».
Hernâni Cidade - « Em Portugal, a arte de fazer versos chegou ao apogeu em BOCAGE. ele foi o máximo cinzelador da métrica... »
In O ARAUTO DE BOCAGE, Nºs. 85 / 86
EDITORIAL BOCAGEANO - "EM LOUVOR DE BOCAGE"
Por
América Miranda
Se Bocage foi e continuará a ser um espantoso poeta isso deve-se ao drama da
sua contradição interna, à sua própria tragédia íntima e ao rigor
criativo, à escolha das palavras, à construção de frases, ao encadeamento
sintáctico, ou estilísticos de vocábulos e imagens. Apesar da sua
extraordinária propensão para repentista e improvisador - o improviso era
moda na época - tudo o que lhe saía da boca trazia, imediatamente, a beleza
exacta da imagística e a justeza perfeita da forma. Neste mês de Setembro em
que passaram 239 anos após o seu nascimento, afirmo aqui que a autêntica
imagem de Bocage é a de um poeta da mais alta estirpe - um poeta que
sublimou a sua tragédia pessoal transformando-a em poesia - sobretudo em
Sonetos, o género poético em que atingiu maiores alturas - da mais bela da
língua portuguesa.
América Miranda
In O ARAUTO DE BOCAGE, Nº 81 / 82
A TRIBUNA DOS POETAS - ANTÓNIO SALA
MEU FILHO
Por
António Sala
Caminhei por entre a multidão, só para te encontrar.
Naveguei por entre a confusão deste revolto mar.
Temporais enfrentei à força de te querer.
Remei contra a maré para puderes viver.
És a minha razão, minha luta e nação, és bandeira a adejar.
És viver, és criança, és flor, malmequer, és pássaro a voar.
És o brilho, és quem respira amor e alegria nos traz.
És o bem que não nega ninguém e que se chama paz.
Criança, és a razão, a andar de mão em mão, floresta a desbravar.
És o querer, a energia, a força de viver, para o mundo cantar.
És a semente, o sol de novas gerações, o princípio da esperança.
Vais criar, de raiz, outro mundo, melhor.
Pois teu nome é Criança !
António Sala
In "Palavras despidas de Música"
POETAS CONSAGRADOS - BARBOSA DU BOCAGE
APENAS VI DO DIA A LUZ BRILHANTE
Por
Barbosa du Bocage
Apenas vi do dia a luz brilhante
lá de Túbal no empório celebrado,
em sanguíneo carácter foi marcado
pelos Destinos meu primeiro instante.
Aos dois lustros a morte devorante
me roubou, terna mãe, teu doce agrado;
segui Marte depois, e enfim meu fado,
dos irmãos e do pai me pôs distante.
Vagando a curva terra, o mar profundo,
longe da Pátria, longe da ventura,
minhas faces com lágrimas inundo.
E enquanto insana multidão procura
essas quimeras, esses bens do mundo,
suspiro pela paz da sepultura.
Barbosa du Bocage
In RIMAS
Segunda-feira, 14 de Fevereiro de 2005
EDITORIAL BOCAGEANO - "EM LOUVOR DE BOCAGE"
Por
América Miranda
Durante muitos anos, o "poeta Bocage" era conhecido pela ignorância do povo
como figura grotesca, a quem se atribuíam situações ridículas e de quem se
contavam asquerosas anedotas, puras invenções de péssimo mau gosto que
deformavam por completo a personalidade ímpar do grande Manuel Maria de
Barbosa du Bocage, sem dúvida, a par com Camões, o maior poeta português
surgido até ao seu tempo. Todas essas calúnias, constituíam uma deplorável
demonstração do baixíssimo nível em que se encontrava e, em grande parte
ainda se encontra, a mentalidade portuguesa. Todavia, o grande Vate,
cingindo-se apenas à verdade, reabilitou a sua memória, limpando-a de
repugnantes impurezas, que tinha sido conspurcada por gerações sucessivas,
restituindo-lhe o brilho fulgurante do Génio. Friso aqui com toda a minha
admiração e com toda a minha alma que Bocage foi grande e que conseguiu em
tão curto espaço de tempo, uma Obra tão vasta e portentosa, digna de ser
lida e conhecida em todo o mundo.
América Miranda
In O ARAUTO DE BOCAGE, Nº 79 / 80
A TRIBUNA DOS POETAS - GRACIETT VAZ
ERA PRIMAVERA
Era Primavera
tarde linda
tarde calma
tarde de imensa alegria
de repente
sobre o casario da aldeia
um negro manto
descia
tarde baça
tarde fria
rua suja
com sangue...
Em lágrimas banhada.
No céu
o sol
de vergonha se escondeu.
Na aldeia
uma ceifeira morreu.
Houve um intermédio,
Abril floriu,
nas entranhas
do teu povo cansado,
a saudade renasceu
com maior intensidade.
Cinquenta anos passados...
o pão continua a faltar.
A aldeia de Baleizão,
a mãe que te trouxe no ventre
e que com todo o seu amor
te pariu
há-de chorar-te
para todo o sempre!
Graciett Vaz
Domingo, 13 de Fevereiro de 2005
A TERTÚLIA POÉTICA ALÉM FRONTEIRAS
«ACADEMIA INTERNACIONAL IL CONVIVIO»
Desde o início deste ano temos estado em regular correspondência com um movimento poético e cultural italiano, criado há pouco tempo e que nos tem proporcionado a troca de mensagens e de opiniões muito interessantes sobre a Arte Poética.
Esse movimento chama-se IL CONVIVIO. Editam uma revista trimensal cultural de excelente nível, que tem o mesmo nome, e já tiveram a delicadeza de nos enviar o primeiro número deste ano. Nela já vem publicado um texto poético nosso, com uma adaptação bastante fiel em línguia italiana. Em troca também já lhe enviamos dois exemplares de O ARAUTO DE BOCAGE, atitude que eles muito estimaram e agradeceram.
Pois este Grupo de pessoas, de grande valor humanístico, instituíram uma associação denominada « Academia Internacional Il-Convivio », sediada em Castiglioni di Secilia. Dela fazem parte, entre outros, homens e mulheres de letras, cientistas e filósofos, artistas plásticos de diversos quadrantes, etc. É presidida esta Academia pelo ilustre poeta Angelo Manitta, também director da revista IL CONVIVIO.
Dirige também um Site na Internet, com a mesma designação, cujo endereço é www.Il-convivio.com e onde temos um espaço de poesia que tiveram a gentileza de nos oferecer.
Propõe esta Academia, vindo ao encontro de sugestão nossa, celebrar um protocolo com a Tertúlia Poética Ao Encontro de Bocage. América Miranda já tem conhecimento desta iniciativa e propõe-se discutir brevemente com os membros da Academia italiana os termos em que se baseará esse Protocolo. Acreditamos poder ser uma boa oportunidade para a internacionalização da nossa Tertúlia e do estabelecimento de um intercâmbio que reputamos de excelente meio de desenvolvimento cultural, bem assim de divulgação, a nível geral da literatura portuguesa e, em particular, da poética Bocageana.
Assis Machado